Faces da mesma mooeda ?

Cotas e ensino de qualidade


 Editorial Gazeta do Povo Quinta-feira, 09/08/2012


A inclusão promovida pelas cotas sociais nas universidades federais é necessária, mas não pode ser feita a qualquer custo


O plenário do Senado aprovou na terça-feira um projeto de lei que reservará, por dez anos, metade das vagas de universidades federais para candidatos que tenham feito todo o ensino médio em escola pública. A reserva de vagas ainda contempla uma parte destinada ao preenchimento por critérios raciais e de renda. Agora, o texto segue para a sanção da presidente Dilma Rousseff, com possíveis impactos sobre vestibulares cujos editais já foram divulgados, como o da Universidade Federal do Paraná. A decisão afeta o delicado equilíbrio entre a questão do acesso das classes menos favorecidas ao ensino superior e a qualidade das instituições universitárias brasileiras.

É inegável que o ensino superior representa uma oportunidade de ascensão social, ainda mais quando obtido por intermédio de universidades públicas, normalmente sinônimo de ensino de qualidade, não obstante a existência de instituições particulares que também são referência nacional. Há diversos estudos mostrando que profissionais com curso superior recebem de duas a três vezes mais que trabalhadores de nível médio e têm mais chance de encontrar emprego, especialmente em áreas nas quais o Brasil vive um déficit de talentos, como as engenharias. Seria injusto que esse privilégio permanecesse restrito às camadas mais altas da população, que podem pagar uma boa faculdade privada ou um ensino fundamental e médio em uma escola particular que dê boas condições de competir por uma vaga nas concorridas universidades públicas. Diante dessa realidade, as cotas sociais parecem uma ideia digna de consideração.

No entanto, ampliar a proporção de cotistas nas universidades federais para 50% de seus futuros calouros, nas condições atuais de baixo investimento na qualidade do ensino fundamental e médio, pode levar a uma súbita queda no nível dos seus alunos. O Indicador do Alfabetismo Funcional (Inaf) 2011-2012, recentemente divulgado, revelou que apenas 35% dos brasileiros com ensino médio (aptos, portanto, a ingressar na faculdade) estão plenamente alfabetizados. Os demais apresentam limitações quanto à leitura e habilidades matemáticas, obstáculos muitas vezes incompatíveis com as exigências de um curso superior. Como, em média, o ensino público é de qualidade inferior ao particular, existe a possibilidade de que as cotas de 50% aumentem a quantidade de calouros que chegam do ensino médio com deficiências que deveriam ter sido sanadas em etapas anteriores de sua formação. Isso força as universidades a gastar tempo “resgatando” esses estudantes, tempo que é tomado à formação específica do ambiente universitário. Universitários que não conseguem absorver todo o conhecimento passado pelos professores têm mais chance de se tornarem profissionais apenas medianos, inibindo o próprio desenvolvimento pessoal. Em julho, a Gazeta do Povo mostrou como as universidades brasileiras, apesar dos altos investimentos, estão longe de serem centros de excelência de nível internacional, e a qualidade do corpo discente é um dos fatores que influem no fraco resultado.

A inclusão é necessária, mas não pode ser feita a qualquer custo sob risco de empobrecer o próprio ensino superior público. A UFPR, em seu vestibular, adota uma solução interessante, já que as cotas (adotadas desde 2005) só se aplicam a partir da segunda fase do processo seletivo; para chegar a ela, os vestibulandos concorrem entre si sem distinção de categoria, garantindo que só passarão pelo filtro inicial os candidatos que comprovarem um conhecimento que a universidade considera suficiente para o início da vida acadêmica.

Nada disso, no entanto, diminui a necessidade de investir maciçamente e de forma eficiente nos ensinos fundamental e médio, já que é nessas fases que reside o verdadeiro gargalo educacional brasileiro, como indica o Inaf. Nesse sentido, vale a pena recordar que a medida aprovada pelo Senado tem duração de dez anos, o intervalo para que uma criança que comece agora o ensino fundamental chegue ao primeiro ano do ensino médio. Se o poder público finalmente acordar para a importância dos estágios iniciais da formação escolar, podemos sonhar com um 2022 em que a boa qualidade do ensino público tornará as cotas desnecessárias.


Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988



TÍTULO II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
 
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ..................................................

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